sábado, 21 de maio de 2016

Sobre os lobos de Wall Street e de Brasília

Olhar o mundo e os seres com olhos amorosos. Tocar o mundo e  os seres com mãos amorosas. Foram esses os melhores ensinamentos que li num livro de inspiração budista.

Os olhos humanos, assim como os dos cães, são mesmo a primeira e mais honesta comunicação entre os seres. Também os olhos da  maioria dos animais revelam, de imediato, agressividade ou receptividade, curiosidade ou impaciência.

Na infância, tínhamos olhos amorosos e mãos amorosas, e também recebíamos, quase sempre sem pedir, o calor e a ternura de olhos e mãos amorosos. Ao crescermos, parece que o amor à vida e à humanidade torna-se atributo de fracos e convém ter olhos de peixe morto ou de tigre enjaulado. Quão raros são olhos de céu azul numa manhã na orla. Ao contrário, a maioria dos olhos gritam "selva!", ou revelam uma Cordilheira dos Andes recobrindo sua  porção humana. Quão raras são mãos que sintam os objetos e seres, que não tenham com eles apenas uma relação utilitarista e fria como a relação de pés que precisam de escadas para chegar ao cume ou de mãos que precisam de cordas para sair de um poço profundo.

Queremos o topo da montanha - o altíssimo, frio e solitário topo - e cedo nos livramos dos incômodos olhos e mãos amorosos com os quais nascemos. Por isso esses olhares oblíquos e cabisbaixos, esses olhares indiferentes e secos, esses olhares de peixe morto e de hiena, para não revelar a própria essência, sobretudo a si próprio.

Talvez Rousseau estivesse certo ao atribuir à cultura essas nossas garras, presas e olhos de predador insaciável, já que não nascemos tigres (nem lobos). Somos condicionados a declarar guerra ao mundo, a sermos lobos do próprio homem para que possamos sobreviver. Então talvez não se trate de uma "natureza humana de lobo" (expressão absurda!), mas de cultura e instinto de sobrevivência.

Somos cordeiros em pele de lobos, pois a sociedade nos obriga a isso. Com o passar dos anos podemos nos tornar, definitivamente, lobos, se todos os resquícios de nossa essência forem apagados. Mas essa afirmação é estúpida, já que os lobos não são criaturas cruéis e desprezíveis como alguns homens que são chamados de lobos. Na verdade, os homens chamados de lobos são os homens que perderam sua essência de homens, sua capacidade de amar e respeitar, e esses não podem ser comparados a lobos, mas a psicopatas.

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